Pontos nada Cardeais III

Uma geografia sensível a partir do Dicionário Amoroso da Psicanálise.

ROUDINESCO, Elisabeth Dicionário Amoroso da Psicanálise, tradução André Telles, Rio de Janeiro, 2019.
Traduzido de Dictionaire amoureux de lá psychanalyse, Paris, Éditions Plon/Seuil, Paris, 2017.

Cidade do México

O mexicano não é uma essência, mas uma história
Nesse país que cultivava laços importantes com o império dos Habsburgo, especialmente no momento da trágica expedição do imperador Maximiliano (1864-67), a psicanálise nunca se constituiu em verdadeiro movimento, ainda que alguns atores, pitorescos, tenham desempenhado ali um papel importante, como Erich Fromm, oriundo de uma família judia alemã, emigrado para os Estados Unidos, depois radicado na Cidade do México em 1950, ou Igor Caruso, vindo de Viena, e Santiago Ramírez, pai fundador da primeira sociedade psicanalítica mexicana. Admirador de Benito Juárez, laico e jacobino, Ramírez se casou com uma católica fervorosa que venerava as valsas de Viena.

Foram sem dúvida essa situação particular e os tumultos da revolução de 1910 que fizeram do México a Terra Prometida de diversas experiências inéditas. Atesta isso, se necessário, a do mosteiro de Cuernavaca. Sempre que vou à Cidade do México, me impressiona a multiplicação dos grupos de terapeutas, cada qual reivindicando uma linha, todos muito dinâmicos e ao mesmo tempo politicamente engajados na vida social dessa megalópole barroca. A psicanálise mexicana lembra um poema de Octavio Paz: “Toda cultura nasce da mistura, do encontro, dos choques. No caminho contrário, é do isolamento que morrem as civilizações.”

O que me fascina nessa cidade gigantesca e extremamente violenta é efetivamente essa mistura entre diversas heranças que convivem: a da cultura pré-colombiana e do período colonial, e aquela, muito mais próxima, do período do entreguerras. Não imagino ir à Cidade do México sem visitar os lugares que me lembram a história do exílio de Leon Trotski e de sua amizade com dois dos maiores pintores da modernidade latino-americana: Diego Rivera e Frida Kahlo. Sei que, em caso de perigo maior, poderia exilar-me nessa megalópole. Meu amigo Helí Morales, grande admirador de Trótski e dos nós borromeanos de Lacan, sempre me disse que sua casa, parecida com a de Frida, era minha. Hospitalidade incondicional.

México 1925
México 2021

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